Ode à Michele

Como o Sol desperto
Depois do abraço do frio
Surge lindo, impávido e quente
A cobrar dos infiéis súditos
O louvor a si devido,
Louvo-te a tua negra beleza!

Sim, negra, cor de feitiço!
De tez acanelada e seio de jambo maduro
De boca macia e melosa, de olhos de opala
E cabelo de bronze
Que houve por bem, e por graça divina
Deixar-se ser amada por um poeta.

Tenho urgência em poetar-te
Por amor próprio
E beleza tua
Que negra, ofusca até do Sol o brilho
Pois que no meu céu nada brilha mais que tu.
És anjo, bem o sabes,
És bela, bem te digo
- E mais bem digo a todos
E mais a Deus dou graças - Tens fogo.
Teu fogo me ilumina, me aquece.
Estar à tua sombra me regozija.

Ah! Quisera não precisar dormir jamais!
Poder descansar só em contemplar-te!
Acordar ao teu lado e ver-te
Em todo o plácido esplendor de tua beleza
Anima-me mais que tudo.

E, ai de mim, se não louvar-te a voz!
Que de fechar os olhos parece um riacho calmo
Tépido, macio, gostoso
E quando te zangas, viras uma cachoeira
Mas não sabes, não consegues ser amarga;
Tua doçura escorre de ti, mesmo se não queres.

E teu cheiro, ah! Teu cheiro!
Soma-se todas as flores, não terão teu cheiro!
Respirar-te é vital ao meu nariz,
Mais, muito mais que o ar insosso
Preciso do teu cheiro impregnando meus pulmões!
Aceita-me!
Aceita meu louvor de poeta!
Aceita meu amor de súdito!

Rodrigo Dias
(in: "Poesias de Família")

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